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Tempo da Criação: momento para uma revolução ecológica

No dia 1° de setembro os cristãos do mundo inteiro celebraram o Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação. Também nesse dia, deu-se início ao Tempo da Criação que abrange 34 dias, tendo seu término no dia 4 de outubro, dia dedicado a São Francisco de Assis. Mas o que é o Tempo da Criação?

O Tempo da Criação é um tempo de renovação da nossa relação com a criação e com o Criador, através da conversão, da oração e da ação. É um período de rezarmos pela Mãe Terra, de avaliarmos nossas ações e de estarmos juntos em oração com nossos irmãos e irmãs cristãos de outras denominações. É o momento propício para melhorarmos nossas práticas em relação ao meio ambiente, derrubar barreiras preconceituosas e antropocêntricas, de aproximarmo-nos mais de Deus e da natureza.

Se voltarmos no livro de Gênesis, veremos que Deus viu tudo o que tinha feito, e que tudo era muito bom (cf. Gn 1, 31). Deus viu que a criação era maravilhosa e que tudo era perfeito. Porém, por que o ser humano não cuidou dessa criação e não zelou por ela como Deus havia lhe confiado? Como a Bíblia nos ensina, o homem pecou ao comer o fruto da árvore do conhecimento. Isto é, o homem, ao buscar esse tão sonhado conhecimento, pensou ser maior que Deus, e foi nesse momento que brotou no coração humano a ganância, a soberba, o orgulho e o desejo de querer ser dono do mundo.

Dessa forma, o ser humano afundado em seu ego, se autocolocou como um ser superior às outras criaturas. Usou de sua inteligência para dominar e submeter o mundo natural. Pela razão e pela técnica, que, se por um lado trouxeram grandes benefícios para a humanidade, por outro deterioraram florestas, rios, povos e culturas. A mesma razão que trouxe conforto para a vida humana, é a mesma que trouxe a maior crise ético-política e ecológica para a humanidade – ético-política e ecológica porque ela não está restrita apenas às questões ambientais, mas também toca as questões sociais e morais.

É paradoxal pensar que a mesma razão que trouxe benefícios também ocasionou tamanha crise. Entretanto, a questão não é refletirmos sobre esse paradoxo, mas pensar um modo de vida que no mesmo instante que nos traga conforto e segurança, nos traga saúde e harmonia com o mundo natural.

O que grande parte das pessoas, instituições e líderes de governos pensam é que nós humanos estamos de certa forma distantes do mundo natural. Eis aí o foco central do problema. Enquanto permanecermos nessa visão, que somos superiores ao mundo natural, vamos continuar a preparar a nossa própria guilhotina.

A problemática ecológica não tem como resposta apenas políticas sustentáveis, como por exemplo, reciclar o lixo, plantar árvores nas calçadas e economizar a água. Sim, de fato isso é importante, mas a questão é bem mais complexa do que imaginamos. Ela envolve o ser humano enquanto ser subjetivo, ser cultural, ser social e ser natural. Tudo está interligado, não apenas no âmbito natural, mas também no âmbito daquilo que foi criado pelo ser humano. A revolução que a Terra espera de nós é sistemática e estrutural, ou seja, ela também tem que vir do sistema que nos rege.

Nesse sentido, por exemplo, uma pessoa desabastecida economicamente não tem condições de adotar uma atitude sustentável como nos apresenta a grande mídia e as políticas verdes, sendo que a mesma não ganha o suficiente para tal. É egoísmo de nossa parte pensar que todos na sociedade tem uma estrutura econômica e social que a possibilite adotar um modelo de vida sustentável e ter acesso a tais ideias e práticas; a nossa sociedade é segregadora e muitos jovens não terminam nem o Ensino Médio.

Essa é apenas uma das questões que devemos nos fazer se quisermos de fato uma revolução ecológica. Teremos que mexer na estrutura que domina a nossa sociedade e o nosso modo de vida. Por isso que é uma revolução. Os indígenas e os povos tradicionais muitas vezes são assassinados porque vão na contramão desse sistema; e aí está uma das consequências que vamos ter se, de fato, adotarmos uma postura ecológica: poderemos sofrer o martírio, assim como Jesus e muitos cristãos sofreram por defenderem a vida.

O primeiro passo talvez dessa revolução seja arrancar de nossas mentes esse pensamento antropocêntrico e tecnocrático que nos foi imposto desde crianças. Percebermo-nos como parte inseparável do mundo natural, em todos os nossos aspectos, seja ele subjetivo, social e ambiental. Se quisermos mudar a nossa realidade, devemos mudar a nós mesmos. Esse Tempo da Criação é o tempo por excelência para refletirmos sobre o nosso modo de vida, sobretudo, nós cristãos. Se estamos de fato sendo irmãos da criação ou se estamos submetendo-a a nossos luxos e ganâncias. É o tempo de nos fazer sentir parte do mundo natural, de sentirmo-nos criação de Deus e entrar em harmonia com o mundo natural. E que através da oração tomemos atitudes para uma verdadeira revolução ecológica.

Luís Filipe Silva Gomes
Pré-noviço agostiniano, bacharelando em Filosofia pelo Instituto Santo Tomás de Aquino – 6º Período (Belo Horizonte – MG).
E-mail: luisfilipe145@gmail.com 

19 set
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